Cara amiga branca,
Cara amiga branca,
Eu sei que sou incrível, linda, inteligente e interessante—e todos os outros adjetivos que você encontrar para tentar sufocar meu desabafo quando digo que, apesar de tudo isso, parece muito difícil ser romanticamente amada.
Por muito tempo, tentei me fazer entender com minhas amigas brancas. Expliquei as vivências, o contexto social, econômico e histórico que me atravessa e atravessa tantas outras mulheres negras. Tentei mostrar que nem tudo se resume a amor-próprio, a “se valorizar”, a “se enxergar”.
Quando se passa a vida sem acesso a afetos—sejam eles saudáveis ou não—é difícil não se perguntar: que porra tem de errado comigo? Querer viver um amor romântico, desejar uma relação de afeto, mas ver todas as tentativas frustradas porque, aparentemente, sou “boa demais”? Isso nos coloca num lugar de invisibilidade ou numa hiperssexualização exacerbada. Ou somos completamente excluídas do jogo, ou reduzidas a meros objetos sexuais.
Acredite, eu não estou desesperada. Na verdade, boa parte de mim já decidiu ser bem sozinha, até por uma questão de autopreservação. Convenhamos.
Mas sua tentativa de ignorar ou reduzir minha dor—sendo alguém que nunca teve problemas em ser desejada e principalmente assumida—me frustra e me silencia. Faz com que eu não me sinta ouvida nessa relação.
Não espero que você entenda completamente. Nossos pontos de partida são muito diferentes. Mas, como minha amiga, gostaria que ao menos reconhecesse que esse problema existe e que me acolhesse, ao invés de descartar a questão como se fosse mera futilidade. Sem desdenhar, sem invalidar meus desabafos só porque essa nunca foi a sua realidade.
Porque, no fim, acreditar e acolher a dor de uma amiga que passou a vida sendo preterida também é um ato de amor. Às vezes, tudo o que queremos é poder desabafar e ser abraçadas. Eu sei do meu valor e aprecio que você o reconheça, mas quando digo que, apesar de tudo—de todo avanço social, dos discursos, das palestras, da militância, dos TCCs e do empoderamento negro—mulheres pretas ainda enfrentam inúmeros obstáculos em suas relações afetivas, não estou exagerando. Digo isso porque é a realidade que vivo, e, por isso, espero de você o mesmo reconhecimento e acolhimento que me disponho a oferecer.
P.S.: Pretinhas, é essencial ter amigas como vocês, que compreendem a totalidade do que significa ser uma mulher negra. Às vezes, estar cercada apenas por pessoas brancas nos faz ignorar atitudes racistas, silenciadoras e invalidadoras.
Beijo e até o próximo post
Talvez aquela sua amiga, que você sabe muito bem quem é, esteja precisando ler essas palavras.
que maravilhoso e doloroso ao mesmo tempo…
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